Esofagite Eosinofílica: uma entidade clínica recentemente reconhecida em evidente expansão mundial

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Introdução

Esofagite Eosinofílica (EE) é uma afecção clínico-patológica caracterizada por densa eosinofilia esofágica associada à intensa hiperplasia do epitélio escamoso, e que geralmente, vem acompanhada de sintomas gastrointestinais, primariamente esofágicos. Na EE as mucosas gástricas e duodenais estão preservadas e as anormalidades esofágicas não respondem ao tratamento com altas doses dos fármacos inibidores da bomba de próton. Trata-se de uma enfermidade cujo reconhecimento, nesta última década, vem aumentando de forma significativa em todos os continentes, com exceção apenas da África. Por exemplo, Spergel e cols. (JPGN 48:30-6;2008), em seu artigo sobre os 14 anos de experiência clínica, baseados em estudos realizados nos Estados Unidos, Suiça e Austrália, relatam que a EE está se tornando cada vez mais prevalente. No Children’s Hospital of Philadelphia verificou-se um aumento de 35 vezes desde os 2 primeiros casos vistos em 1994 para 72 atendidos em 2003. Outros estudos têm demonstrado uma predominância do sexo masculino, a maioria dos pacientes refere atopias, alcançando até 70% dos casos dependendo das localizações geográficas dos relatos.

Definir EE não é uma tarefa fácil porque sua sintomatologia clínica pode se sobrepor à da Doença do Refluxo Gastro-Esofágico (DRGE). Entretanto, embora a DRGE possa coexistir com a EE, os sintomas e os aspectos patológicos intrínsecos da EE não respondem ao tratamento baseado na supressão ácida gástrica. Muito embora freqüentemente ocorra hiperplasia das células basais da mucosa esofágica na EE, o que também pode se dar na DRGE, o principal aspecto de diferenciação histológica na EE é a intensa eosinofilia da mucosa esofágica, inclusive a usual formação de micro-abscessos eosinofílicos. Por outro lado, é também sabido que a eosinofilia esofágica pode ser encontrada em outras enfermidades, tais como, Doença de Crohn, enfermidade vascular do colágeno, esofagite infecciosa (herpes, Candida), esofagite associada a medicamentos, síndrome hiper-eosinofílica, escleroderma, lesões cáusticas, imunosupressão (especialmente seguida a transplante de órgão sólido) e gastroenteropatia eosinofílica. EE também pode estar associada a outras enfermidades, em especial com Doença Celíaca. Portanto, foi necessária a organização de um grande encontro científico que reuniu os mais internacionalmente reconhecidos pesquisadores a respeito desta entidade clínica para elaborar um documento que ademais de definirEE, concomitantemente também estabelecesse critérios para excluir o diagnóstico das supracitadas enfermidades em relação à própria EE. Estas propostas foram levadas a cabo no First International Gastrointestinal Eosinophil Research Symposium, ocorrido em Orlando, Flórida, em outubro de 2006 e as conclusões deste evento científico estão publicadas em artigo assinado por Glenn T. Furuta e cols. na revista Gastroenterology 2007:133:1342-63.

Desta forma, EE foi definida como uma afecção clínico-patológica primária do esôfago caracterizada por sintomas esofágicos e do trato gastrointestinal superior associada a espécimes de biópsia da mucosa esofágica contendo >15 eosinófilos intra-epiteliais(eos)/campo de maior aumento (cma) em 1 ou mais espécimes de biópsia, na ausência de DRGE que se fez descartar por estudo de pHmetria, o qual tenha se revelado normal no esôfago distal, ou a falta de resposta clínica a altas doses de medicamentos inibidores da bomba de próton (Figura 1). 

História

O primeiro caso de EE foi descrito por Dobbins e cols. (Gastroenterology 1977;72:1312-16), em 1977, em um paciente adulto que referia sofrer de disfagia e apresentava inflamação eosinofílica do epitélio esofágico mas não exibia sintomas compatíveis com DRGE. Ao longo dos anos de 1980 passaram a ser descritos vários casos de eosinofilia epitelial esofágica em espécimes de biópsia em pacientes portadores de DRGE. No entanto, foram Leape e cols. (J Pediatr Surg 1981;16:379-84) e Hyams e cols. (JPGN 1988;7:52-6) que reconheceram que um grupo de pacientes que apresentava eosinofilia intra-epitelial esofágica não respondia com sucesso ao tratamento clínico para a DRGE. Um aspecto peculiar destes pacientes referia-se à presença de um denso infiltrado eosinofílico (>20 eos/cma) na mucosa esofágica. No entanto, desde o final dos anos 1980 até meados dos anos 1990, a maioria dos patologistas entendia que a existência do infiltrado eosinofílico era um sinal patognomônico da DRGE. Mas, em contrapartida, nesta mesma época, alguns investigadores já começavam a sugerir que a etiologia desta intensa eosinofilia esofágica apresentada por alguns pacientes não devia ser atribuída à DRGE. Por exemplo, Lee (Am J Surg Pathol 1985;9:475-79) relatou uma série de crianças e adultos em cujas biópsias esofágicas havia uma “intensa eosinofilia”, que por ele foi definida como >10 eos/cma. Especialmente, chamou sua atenção uma menina de 15 anos que sofria de asma e queixava-se de dor abdominal com eosinofilia periférica e que Lee classificou ser um caso exemplar de “esofagite eosinofílica idiopática”.

Attwood e cols. (Dig Dis Sci 1993;38:109-16) estudaram 11 pacientes adultos com disfagia, monitoração normal do pH esofágico e densa eosinofilia esofágica (>20 eos/cma). Sete destes pacientes sofriam de alergia alimentar e todos eles necessitaram ser submetidos a medidas terapêuticas agressivas tais como dilatação esofágica e/ou emprego de corticóide para que os sintomas cedessem. Importante enfatizar que um grupo controle de pacientes com DRGE apresentava em média3,3 eos/cma na mucosa esofágica, o que levou os autores a questionar a, até então, atribuição automática da eosinofilia esofágica à DRGE.

Kelly e cols. (Gastroenterology 1995;109:1503-12), em um primoroso estudo descreveram 10 crianças que apresentavam sintomas similares à DRGE com intensa eosinofilia esofágica a despeito de terem recebido tratamento anti-refluxo. Inclusive, 2 destes pacientes haviam sido submetidos à cirurgia de fundo-plicatura.Todos os pacientes foram tratados com fórmula à base de mistura de amino-ácidos e responderam de forma muito satisfatória, sugerindo, portanto, uma etiologia alérgica para esta enfermidade. Mais ainda, durante os anos 1990 vários trabalhos foram publicados descrevendo crianças que apresentavam densa eosinofilia esofágica (>15-20 eos/cma) e que evidenciavam resposta clinico-patológica favoráveis a restrições dietéticas com o emprego de fórmulas à base de mistura de amino-ácidos, corticóides por via oral ou tópica. Finalmente, Steiner e cols. (AM J Gastroenterol 2004;99:801-5) demonstraram uma relação inversamente proporcional entre a contagem de eosinófilos intra-epiteliais e índice de refluxo, ou seja, 1-5 eos/cma correlacionava-se com índice de refluxo elevado.

Assim sendo, ao longo destes últimos 30 anos todos estes estudos foram pouco a pouco demonstrando que pacientes que apresentavam sintomas da DRGE que não respondiam satisfatoriamente à medicação anti-refluxo e que concomitantemente apresentavam denso infiltrado eosinofílico na mucosa esofágica, na verdade não eram portadores da DRGE, mas sim sofriam de outra enfermidade que em alguns casos estava relacionada com algum tipo de alergia e que passou a ser denominada EE.

Manifestações Clínicas

EE possui inúmeras diferentes formas de apresentação, a saber: os pacientes comumente têm dificuldade para se alimentar, “failure to thrive”, vômitos, dor epigástrica ou torácica, disfagia e impactação do alimento.Recusa alimentar ou intolerância aos alimentos é um sintoma comum da EE, em especial entre os lactentes, os quais, devido à tenra idade, não são capazes de relatar os sintomas. As crianças maiores freqüentemente apresentam sintomas similares à DRGE, que incluem regurgitação e queimação retro-esternal, muito embora as estimativas variem consideravelmente entre os relatos disponíveis na literatura, de 5 a 82%. Vômitos (8 a 100%) e dor abdominal (5 a 68%) também têm sido relatados, bem como disfagia (16 a 100%) e impactação dos alimentos (10 a 50%). Todos estes sintomas tendem a se agravar com o avançar da idade.

História Natural

EE apresenta a nítida tendência de ser uma enfermidade crônica cujos sintomas são persistentes ou recidivantes. Estes sintomas costumam ocorrer em ordem progressiva, desde a infância até a vida adulta. Os adultos tipicamente sofrem de disfagia recorrente e impactação dos alimentos, as quais são refratárias ao tratamento com drogas anti-refluxo; na verdade, estudos recentes indicam que de 10 a 50% dos pacientes adultos do sexo masculino que apresentam este tipo de sintomatologia sofrem de EE. Embora uma estenose em local bem definido do esôfago possa ser responsável pela disfagia e pela impactação da comida observadas em alguns pacientes com EEhá evidencias de que o esôfago demonstra um defeito da função do músculo liso, à semelhança de uma falta de sincronismo de contração entre a camada muscular circular e a longitudinal durante a deglutição, a qual discutirei com maior riqueza de detalhes em outra oportunidade.

Liacouras e cols. (Clin. Gastroenterol Hepatol 2005;3:11961206) foram responsáveis por descrever o maior estudo longitudinal abrangendo 381 crianças com EE (66% meninos, idade média 9 anos). A grande maioria deles apresentava sintomas da DRGE refratária ao tratamento de supressão ácida ou disfagia. A radiologia contrastada do trato digestivo superior demonstrou estreitamento esofágico em 6% das crianças. A endoscopia evidenciou a presença de anéis (Figura 2) em 12%, e 1 paciente requereu o emprego de dilatação esofágica.

Em um subgrupo de pacientes, tratamento clínico com corticosteróides sistêmicos induziu remissão clínico-patológica em todos os pacientes exceto em 1 deles. Tratamento tópico com fluticasone foi utilizado com sucesso em 52% dos pacientes, porém 2 deles desenvolveram candidíase. Após a suspensão do tratamento clínico, porém, a maioria dos pacientes apresentou recidiva dos sintomas e eosinofilia esofágica (Figura 3).

Tratamento dietético na forma de restrições alimentares específicas ou emprego de fórmula à base de mistura de aminoácidos mostrou-se altamente eficaz para a indução e manutenção da remissão dos sintomas (97,6% mostraram resposta clínico-patológica positiva). O estudo radiológico contrastado do esôfago normalizou-se em 21 dos 22 pacientes que apresentavam estenose esofágica.

É importante ressaltar que a EE não parece ser um fator causal que limita a expectativa de vida dos pacientes. Metaplasia esofágica, potencial causa de adenocarcinoma esofágico, nunca foi, até o presente momento, relatada em pacientes portadores de EE, mesmo em adultos que sofrem de doença grave. EE não é uma enfermidade caracterizada por ulceração ou destruição da mucosa.Portanto, tudo indica que a base do processo patológico da EE difere daquela da DRGE, e que, o adenocarcinoma ou o câncer escamoso do esôfago não fazem parte do espectro da EE. 

Fisiopatologia

A patogênese da EE está diretamente relacionada com atopia, como tem sido descrito em pesquisas de co-ocorrência de doença, em estudos com modelos animais, e também a partir dos relatos de sucesso terapêutico quando são evitados determinados alergenos (controle dietético primário). A maioria dos pacientes revela nítidas evidências de hipersensibilidade a certos alimentos e alergenos aéreos, bem como, uma história concomitante de alergias respiratórias (Figura 4).

Ao contrário da anafilaxia alimentar, a qual ocorre em cerca de 15% dos pacientes portadores de EE, a sensibilização pelo pólen para uma grande série de alimentos (baseada no exame da pele pelo prick test) pode ser caracterizada na maioria dos pacientes. O papel central da sensibilização por antígenos alimentares tem sido demonstrado pelo êxito resultante da redução das exposições a antígenos alimentares específicos definidos pelos testes prick e patch, ou mesmo pela introdução de uma fórmula à base de mistura de amino-ácidos. Para confirmar estas premissas Kagalwalla e cols., em 2006, (Clin Gastroenterol Hepatol 4;1097-1102) realizaram um estudo retrospectivo observacional de curta duração para avaliar as respostas clínicas e histológicas em 60 crianças portadoras de EEanalisadas durante 6 semanas, as quais foram divididas em 2 grupos de acordo com a intervenção dietética: 1- 35 delas recebeu tratamento dietético com a eliminação de 6 tipos de alimentos, a saber: proteína do leite de vaca, soja, trigo, ovos, amendoim e frutos do mar; 2- as outras 25 crianças receberam tratamento dietético utilizando fórmula à base de mistura de aminoácidos. Após o período de avaliação dietética novas biópsias de esôfago foram realizadas. Os resultados das intervenções dietéticas mostraram que 26 (74%) das crianças do Grupo 1 e 22 (88%) das crianças do Grupo 2 alcançaram uma significativa redução da inflamação esofágica em média com menos de 10 eos/cma. No momento pré-tratamento e pós-tratamento as contagens de eosinófilos esofágicos foram de 80,2 e 13,6 para o Grupo 1, e 58,8 e 3,7 para o Grupo 2, respectivamente. Estes rsultados mostraram-se altamente significativos. 

Os autores concluem que o tratamento com a dieta de exclusão e o emprego da fórmula à base de aminoácidos foram eficazes para a regressão dos sintomas e das lesões histológicas, sendo que a dieta de exclusão teve a vantagem de proporcionar maior aderência ao tratamento pela melhor palatabilidade dos alimentos.

Tem sido notória a observação de que pacientes portadores de rinite alérgica apresentam elevações sazonais dos eosinófilos esofágicos, e, além disso, tem também sido demonstrado que pacientes portadores de EE apresentam variações sazonais dos sintomas. Estes fatos reforçam as evidências clínicas que dão suporte à idéia de que os alergenos aéreos são responsáveis por provocar uma resposta eosinofílica no esôfago. Por exemplo, em modelo animal, utilizando camundongos, o emprego de repetidas exposições intra-nasais do alergeno aéreo Aspergillus fumigatus induz simultaneamente eosinofilia das vias respiratórias e inflamação esofágica, sem que haja concomitantemente eosinofilia no trato digestivo inferior.

Mecanismo Causador da Disfagia

Korsapati e cols. (Gut 2009;58:1056-62) propuseram que o mecanismo da disfagia se deve a uma incoordenação da musculatura longitudinal do esôfago. Estes autores utilizaram a ultrasonografia endoscópica para medir a espessura dos músculos circulares e longitudinais do esôfago e observaram que ela está, em repouso, significantemente aumentada nos pacientes com EE em relação a um grupo controle. Durante as contrações, entretanto, a espessura dos músculos dos pacientes apresenta um pico menor do que nos controles, indicando uma disfunção contrátil. Naqueles pacientes portadores de EE sintomática foi observado que o músculo longitudinal não apresenta uma reação normal, tanto no que diz respeito a uma contração mais fraca quanto a um tempo de maior demora para contrair ao receber determinado estímulo (assincronia) enquanto que o músculo circular parece não estar afetado e, portanto, apresenta uma atividade normal.

Genética

Há claras evidências de que a EE apresenta uma forte associação familiar. Aproximadamente 10% dos pais de pacientes portadores de EE apresentam uma história de estenose esofágica e cerca de 8% deles sofrem de EE comprovada por biópsia. Em um estudo conduzido por Collins e cols. (Clin Gastroenterol Hepatol 2008;6:621-29) envolvendo 798 pacientes pediátricos, em 27 deles detectou-se a existência da mesma enfermidade em pelo menos um irmão ou nos pais. Rothenberg e cols. (N Engl J Med 2004;351:940-41) recentemente relataram casos múltiplos de EE em 27 famílias, cujas características clínicas, patológicas e genéticas eram bastante semelhantes entre si. Desta forma a existência de EEfamiliar pode ser tipicamente identificada entre os irmãos ou entre os filhos e os pais.

O Potencial Papel dos Eosinófilos

Os grânulos constituintes dos eosinófilos são freqüentemente detectados em locais extracelulares do esôfago em pacientes portadores de EE; há uma forte evidência da ocorrência da ativação e da degranulação dos eosinófilos no tecido esofágico. Estudos in vitro têm demonstrado que os grânulos constituintes dos eosinófilos são tóxicos para vários tecidos, incluindo o epitélio intestinal. Os grânulos eosinófilos contêm um núcleo cristalóide composto por uma base protéica major (MBP)-1 e -2 e uma matriz composta por uma proteína catiônica eosinofílica (ECP), uma neurotoxina derivada do eosinófilo (EDN) e uma peroxidase derivada do eosinófilo (EPO). Estas proteínas catiônicas compartilham alguma atividade pró-inflamtória, ainda que agindo de formas independentes. Por exemplo, MBP, EPO e ECP possuem efeitos citotóxicos sobre o epitélio esofágico em concentrações semelhantes a aquelas encontradas em fluidos biológicos de pacientes com eosinofilia. A MBP age diretamente sobre o músculo liso aumentando sua reatividade por meio da ruptura dos receptores M2 da função vagal muscarínica. Além disso, a MBP também induz a degranulação dos mastócitos e dos basófilos. O envolvimento dos receptores de citocina, imunoglobulinas e complemento leva os eosinófilos a produzir a extensa gama de citocinas pró-inflamatórias que inclui IL (interleucina)-1, IL-3, IL-4, IL-5 e IL-13, fator de estímulo de colônias de granulócitos monocíticos, fator de transformação do crescimento (TGF)-alfa, TGF-beta, fator de necrose tumoral alfa, etc., ou seja, os eosinófilos possuem a potencial capacidade de modular múltiplos aspectos da resposta imunológica. Os eosinófilos são capazes de produzir 3 mediadores lipídicos (leucotrienos C4 e E4, e fator ativador plaquetário) que aumentam a permeabilidade vascular e da secreção mucosa e, que também são potentes estimulantes da contração do músculo liso, o que pode ser um importante fator de contribuição para a dismotilidade verificada na EE. Por estas razões os eosinófilos são, de fato, células pleiotrópicas (capacidade de gerar mais de um efeito) que iniciam as respostas imunológicas adaptativas e, mais do que isso, sustentam e propagam as reações inflamatórias (Figura 7).

Investigação Diagnóstica

Endoscopia

Uma grande série de anormalidades marcantes na mucosa esofágica tem sido caracterizada à endoscopia, tais como: ranhuras longitudinais, friabilidade, edema, aparecimento de placas esbranquiçadas, exsudatos esbranquiçados, traqueização do esôfago, mucosa semelhante a papel “crepe” e diminuição do calibre esofágico (Figuras 8- 9 & 10).

É importante salientar que a suspeita de EE deve ser sempre levantada em qualquer paciente que apresente sintomas semelhantes à doença do refluxo gastro-esofágico associada a uma anormalidade da mucosa esofágica. Embora nenhum dos sintomas seja considerado patognomônico de EE, a presença de um ou mais destes achados são altamente sugestivos para o diagnóstico de EE. Por outro lado, alguns estudos têm inclusive relatado mucosa esofágica de aparência normal.

Avaliação da Biópsia Esofágica

Nos estudos iniciais os relatos dos espécimes de biópsia esofágica referiam-se praticamente apenas aos materiais obtidos do esôfago distal. Entretanto, ao longo dos últimos anos, vem aumentando o número de estudos que incluem também espécimes de biópsia esofágica obtidos da porção média e superior do esôfago.Três pontos importantes emergiram destes estudos, a saber: 1- muitos estudos têm demonstrado que as anormalidades histopatológicas são freqüentes em espécimes de biópsia obtidas de mucosa esofágica com aparência macroscópica normal; 2- deve-se eleger um meio de preservação do espécime de biópsia, que será analisado microscopicamente, que permita identificar eosinófilos com facilidade; 3- à medida que se aumenta o número de espécimes de biópsia há uma relação direta com o achado de um número aumentado de eosinófilos acima de 15 eos/cma (Figuras 11 – 12 & 13)

A experiência clínica sugere que as áreas de aparência mais anormais à endoscopia, bem como a obtenção de espécimes do esôfago proximal e médio (mesmo se a mucosa mostrar-se aparentemente normal) devem ser avaliadas histologicamente. Vale a pena enfatizar que as biópsias do estômago e do duodeno também devem ser obtidas para descartar outras patologias que cursam com eosinofilia em todo o trato digestivo, tais como a gastroenteropatia eosinofílica e mesmo as doenças inflamatórias intestinais.

pHmetria Esofágica

Dados de estudos de monitoração do pH esofágico têm demonstrado que não há quaisquer alterações neste teste em cerca de até 90% dos pacientes.

Manometria Esofágica

Há apenas 3 estudos de investigação da manometria esofágica em pacientes pediátricos com EE que incluem 14 crianças e em todas elas a manometria revelou-se dentro dos limites da normalidade. Por esta razão a manometria não fornece valor diagnóstico na EE.

Ultrasonografia Endoscópica

Há somente 1 estudo que investigou 11 crianças, o qual revelou um espessamento significativo da parede esofágica e das camadas individuais do tecido esofágico, incluindo uma combinação das camadas mucosa e sub-mucosa, bem como damuscularis mucosae, em comparação com controles normais.

Radiologia

O achado radiológico mais característico é o estreitamento da luz do esôfago.

Tratamento da EE

O tratamento da EE baseia-se na eliminação de alimentos da dieta, abordagens anti-inflamatórias (Figura 1) e dilatação esofágica quando estenoses se fazem presentes. É importante assinalar que a dilatação esofágica está associada a uma taxa de risco relativamente elevada de perfuração, desta forma seu emprego deve ser efetivado com a devida cautela. Os pacientes portadores deEE devem ser tratados inicialmente com medicamentos anti-refluxo porque a acidês pode desencadear eosinofilia esofágica, muito embora esta seja em geral de menor magnitude do que aquela associada à EE. Mesmo quando o refluxo patológico não se encontra presente, a exposição ácida apresenta um potencial para irritar a mucosa esofágica inflamada. No caso de ocorrer um insucesso com a terapia contra a doença do refluxo (baseando-se na avaliação histológica), a eliminação de determinados alergenos específicos (através de dietas bastante restritas), ou mesmo a utilização de fórmula elementar baseada em mistura de aminoácidos está indicada.

Liacouras e cols. (Clin Gastroenterol Hepatol 2005;3:1198-1206) realizaram um estudo retrospectivo de 10 anos incluindo 381 pacientes e, no qual, observaram que a eliminação de antígenos alimentares, primariamente pela utilização de dieta elementar, refletia em significante redução dos sintomas clínicos e da lesão histológica do esôfago em 98% dos casos. Por outro lado, muito embora a eliminação dietética represente uma estratégia eficiente, é difícil de ser aplicada na prática porque os pacientes geralmente se encontram sensibilizados por múltiplos grupos de alimentos, os quais incluem tipos comuns e incomuns de comidas. Além disso, o resultado do prick test não identifica de maneira uniforme os alimentos mais apropriados para serem retirados da dieta. O patch test tem sido proposto para identificar os alimentos alergênicos e que, portanto, devem ser eliminados da dieta podendo, assim, induzir uma remissão da enfermidade; porém, não tem havido uma consistência nos resultados da aplicação deste teste, o que torna sua utilização, até o presente momento pouco encorajadora.

Apesar de que a prescrição de dieta consistindo exclusivamente de fórmula à base de mistura de aminoácidos resulta eficiente quanto à redução dos sintomas da EE, freqüentemente esta dieta não é bem tolerada devido a sua baixa palatabilidade, necessitando muitas vezes ser infundida por sonda naso-gástrica. Este procedimento a médio e longo prazos torna-se altamente inconveniente para o paciente, o que representa um fator limitante para sua utilização universal.

O uso de glicocorticóides seja por via sistêmica ou por aplicação tópica, tem sido empregado com resultados satisfatórios em um elevado número de pacientes. A prescrição de corticóides por via sistêmica tem sido feita para pacientes que apresentam exacerbação aguda dos sintomas, enquanto que a aplicação tópica tem sido empregada para oferecer controle da doença a longo prazo.

Finalmente, é importante enfatizar que a EE trata-se de uma enfermidade crônica, e como tal, necessita tratamento continuado, posto que as manifestações clínicas quase que uniformemente reaparecem quando a medicação é suspensa, seja quando os corticóides são descontinuados ou a dieta liberada.

Isto posto, terminamos esta extensa revisão de uma enfermidade que se mostra cada vez mais prevalente em todo o universo e que requer, portanto, uma especial atenção quanto ao seu diagnóstico e tratamento (Figura 15).